domingo, 20 de janeiro de 2013


                                COMISSÃO NACIONAL DA VERDADE



          Passados oito meses da definição de seus membros e efetiva instalação, o tempo faz-se propício para que possa partilhar com todos minha vivência nessa missão, ainda que inconclusa, ainda que a retratar experiências não encerradas.
          De plano, que se assente, com total certeza, a imprestabilidade da argumentação a bradar o caráter revanchista da Comissão Nacional da Verdade porque dois lados existem e, então, como não se investigar, também a conduta dos que, politicamente, se opuseram ao Estado ditatorial militar?
          Não há dois lados, na verdade não há lado algum, mas uma única realidade, normativamente caracterizada.
          Com efeito, como está mesmo na Exposição de Motivos que fundamentou a Lei nº 12.528/2011, que criou a Comissão Nacional da Verdade, com a Lei nº 9.140/1995, ficou assentado que o Estado brasileiro, por seus agentes públicos, cometeu graves violações em detrimento da pessoa.
          Ora, por tal razão, que é cristalina, a Comissão Nacional da Verdade deve cuidar exclusivamente de averiguar os fatos consumados por agentes públicos, dado que com a edição da Lei nº 9140/1995, cujo ciclo normativo a Lei nº 12.528/2011 encerra, reiterando o que acima disse, o Estado brasileiro reconheceu como mortos, por seus agentes públicos, “pessoas que tenham participado ou tenham sido acusadas de participação em atividades políticas” ( artigo 1º da Lei nº 9140/1995)
          Assim, a muitos dos opositores do Estado ditatorial militar em momento algum garantiu-se-lhes regular processo. Foram arbitrariamente seqüestrados, presos, torturados, mortos e desaparecidos pelos agentes públicos da repressão oficializada.
          É fora de dúvida que esses agentes públicos, não importa a posição em que tenham figurado, conspurcaram o bom nome das instituições a que serviam, que com eles não devem ser confundidas.
          Não tem cabimento algum dizer-se, nesse passo, que “cumpriam ordens superiores”.
          Ora, é da tradição do direito universal que só se escusa a alegação de pautar-se no cumprimento de ordem de superior hierárquico, quando essa ordem não seja manifestamente ilegal.
          Por-se a torturar; dispor-se a matar, inclusive fazendo desaparecer, quem já se encontrava totalmente subjugado, obviamente não escusa ninguém, justo por assim se caracterizarem gravíssimas violações aos direitos humanos.
          A Comissão Nacional da Verdade tem o dever legal, portanto, de buscar esclarecer essas situações.
          Essa missão é sua, mas necessita empreendê-la com todos.
          Por si, e em si mesma, a Comissão Nacional da Verdade não chega a lugar algum.
          Eis porque todos nós, membros da Comissão Nacional da Verdade, concretamente já percorremos vários Estados-membros da Federação brasileira, e continuaremos a percorrer os demais, incentivando e dialogando para que Comissões, sejam elas oficiais, sejam elas da sociedade civil, surjam para contínuo trabalho conjugado, e sigam adiante, mesmo após o fim de nosso mandato.
          Além de esclarecer – já o disse antes – os mais vários episódios, que marcaram o período do Estado ditatorial militar, é missão de todos nós, claro propulsionada pela Comissão Nacional da Verdade, estabelecer permanente rede protetiva da Democracia, para que jamais, em solo brasileiro, as gerações presentes e as gerações futuras sejam arrastadas e padeçam dos desmandos brutais e incontrolados do Estado ditatorial militar. Creio, firmemente, ser esse o escopo maior devido por todos nós aos que quedaram vitimados pela truculência descomedida do Estado ditatorial militar.
          O resgate da memória é a garantia do presente livre: unidade na diversidade. O resgate da verdade é a certeza do presente no futuro: novidade na continuidade.
          “Para que não se esqueça, para que nunca mais aconteça”.

                                                    Paz e Bem.